Housing First

O programa "Braços Abertos" é uma nova e interessante intenção de reduzir os graves problemas de saúde, sociais e de segurança na Cracôlandia, uma grande cena aberta em São Paulo. "Braços Abertos", lançado pelo prefeito de São Paulo Fernando Haddad em dezembro de 2013, tem como alvo cerca de 400 usuários de drogas que antes viviam nas ruas de Cracolândia. O projeto oferece aos moradores que deixem as casas que estavam agachadas na "favela" para se alojarem em um dos cinco motéis contratados pelo governo para esse fim. Lá, eles têm acesso a cuidados de saúde, eles têm a oportunidade de trabalhar quatro horas por dia (limpeza de parques e outros locais públicos) por 4 £ por dia, e eles recebem 3 refeições por dia. Mesmo que haja uma forte presença policial nessa área, a polícia geralmente não prende pessoas por usar ou vender crack lá, contanto que esteja confinado na área. As informações são fornecidas aos usuários sobre programas de tratamento existentes e outros serviços, mas não há obrigação de usá-los.

O fato de que não há exigência de usuários de crack para desistir de seu uso de drogas tem levado a fortes críticas de alguns funcionários de São Paulo e assistentes sociais. Seu argumento era que o projeto atrasaria a reabilitação das pessoas dependentes, e que faria mais fácil para que os povos continuem usando drogas. Foi alegado que o programa tinha sido implementado com pouca base empírica.


O que eles tendem a esquecer é que os programas de habitação para as pessoas dependentes de drogas sem obrigação de se envolver em um tratamento ou de abandonar o uso de drogas têm existido pelo menos desde o início dos anos 1990, quando Sam Tsemberis lançou Pathways to Housing, O primeiro primeiro programa de habitação. Desde então, este modelo tem sido implementado em muitas cidades ao redor do mundo.

Os programas Housing First foram criados para ajudar as pessoas sem-teto que sofrem de dependência de drogas e doenças mentais a ficar alojadas e minimizar os seus danos sociais e de saúde. Uma gama de serviços sociais são geralmente oferecidos dentro dos programas, mas as pessoas não têm qualquer obrigação de usá-los. A visão destes programas é que se você fornecer as pessoas sem teto com um lugar para viver, eles terão a oportunidade de estabilizar e talvez iniciar um processo de recuperação que seria muito mais difícil de fazer enquanto vivem na rua.
Desde a década de 1990, numerosos programas da Housing First foram implementados em todo o mundo: em mais de 50 cidades dos EUA; Montreal, Toronto, Winnipeg e Vancouver no Canadá; Lisboa, em Portugal; Bruxelas, Anvers, Charleroi, Gand e Liège, na Bélgica; Toulouse, Lille, Marselha e Paris em França; Bem como em Glasgow (Escócia), Amsterdão (Países Baixos) e Helsínquia (Finlândia). Na Dinamarca há planos para desenvolver programas de Habitação Primária, e programas de habitação de baixo limiar sem uma exigência de abstinência já existem.

Os programas Housing First foram sistematicamente avaliados em todo o mundo. Globalmente, estes programas mostraram resultados muito melhores do que os programas "Tratamento Primeiro". Os principais resultados da avaliação do Programa Habitação First são: redução do uso e dependência de drogas; Uma diminuição do serviço de emergência e admissões hospitalares; Uma melhor percepção da escolha dos serviços prestados; Menor participação em atividades criminosas; E maiores taxas de retenção de moradias do que os programas de habitação de maior limiar.

Mantenha-se atualizado com os desenvolvimentos da política de drogas assinando o Alerta Mensal do IDPC.

Um componente essencial do modelo Housing First são os serviços intensivos prestados aos sem-abrigo crónicos e aos sem-abrigo mentais que este modelo foi concebido para: apoio de pares, equipes multidisciplinares que prestam assistência, pequenas quantidades de casos  que são Responsivos e qualificados o suficiente para trazer estabilidade a esta população vulnerável e de alto risco. Este complemento completo de serviços raramente está presente, mas por alguma razão, muitos em Washington insistem que o modelo funcionará de qualquer maneira. É como vender um carro com três rodas.

NOVOS OLHARES SOBRE A POLÍTICA PARA POPULAÇÃO DE RUA: UM DIÁLOGO ENTRE PAÍSES


“Os indivíduos mendigos são responsáveis pela sua condição: opera-se uma passagem de responsabilidade ética para a posição social, e enfatiza-se a profissionalização de determinados pedintes. Os indivíduos são portadores de vários estigmas; apatia, ociosidade, periculosidade, loucura, etc., e o fenômeno, no conjunto, é suporte de estigmatizarão institucionalizada, encarado como microcosmo desviante e patológico. Opera-se através do estigma, desse modo, uma segregação do fenômeno nos limites de um tríplice círculo: psíquico (mendicância/loucura), ético (mendicância/amoralidade) e social (mendicância/indigência)”.

A citação acima pontua a visão que durante séculos foi atribuída ao segmento que, hoje, no Brasil, conhecemos como “pessoas em situação de rua”. É apenas a partir da década de 70 que começa a existir um diálogo entre diversos países do mundo voltados para o entendimento desta “estratégia de vida” e a finalidade maior é a definição de instrumentos que permitissem o enfrentamento das situações incômodas que estes indivíduos ocasionavam.

Se antes estes seres eram considerados pitorescos e responsáveis pelas suas próprias condições de vida, começa-se a refletir sobre a responsabilidade coletiva das sociedades.

O entendimento anterior era que esta vida era fruto de uma situação de alcoolismo e marginalidade provocadas por uma escolha que tanto poderia ter sido construída pela má sorte como por uma degeneração hereditária.

Justificavam um pesado estigma que dificultava ainda mais a estas pessoas saírem de sua condição apontando o castigo por aquela vida de vício e preguiça que os transformava numa classe social inapta. Pelo bem da sociedade, estes indivíduos mendigos deveriam ser eliminados e os instrumentos para isso eram a criminalização e a discriminação. Esta última estendia-se aos grupos e pessoas que os apoiavam já que aqueles eram considerados parasitas, perigos para a ordem da sociedade e difíceis de treinar para que, algum dia, pudessem ser úteis à sociedade.

Ainda que sempre tenha havido pobres, nos campos e nas cidades, é com o êxodo rural provocado pela Revolução Industrial (século XVIII) que ganham visibilidade as milhares de famílias e pessoas sós que saíram de seus locais de origem em busca do progresso alardeado pelas “cidades grandes”.
Este êxodo causa um déficit habitacional e um desemprego que vai construir uma camada de indivíduos que por serem incapazes de utilizar o progresso são considerados fracassados sociais. Dentre eles, os cidadãos mendigos.

Por força da sobrevivência, estas pessoas vão construir estratégias divergentes daquelas propostas pela sociedade, o que justifica mais uma vez o estigmatizá-los.
Paradigmas em construção.

É a partir da década de 80 que estas pessoas em situação de rua passam a estar no foco das preocupações com a pobreza tanto nos países europeus como nos Estados Unidos e no Brasil.
A leitura anterior buscava construir o perfil destas pessoas considerando gênero, idade, percurso, patologias mentais e o uso de álcool e drogas, no entendimento de que esta problemática estava centrada no indivíduo e que as respostas precisariam ser de apoio intensivo já que as situações eram bastante complexas.

A ONU – Organização das Nações Unidas definiu 1987 como Ano Internacional de Abrigo para os sem teto.

Um passo significativo para isso foi a ampliação do universo de entendimento de quem são estes “sem teto” já que precisamos incluir migrantes, jovens recém-desempregados, vítimas de uma cultura agressiva de facilitação de crédito (incompatível com seus baixos rendimentos), mulheres, famílias monoparentais, idosos, ciganos e outras minorias. Muitas destas pessoas são “indocumentadas”.

Nos últimos quinze anos, houve um aumento expressivo destes “sem teto” em toda a Europa. Esta ampliação do universo destes “sem teto” exige que se enfrente a heterogeneidade de situações e trajetórias[3]. Sabe-se, hoje, que além de fatores vinculados a relações pessoais, devem ser levados em conta questões estruturais, institucionais já que estes fatores são complementares.

Analisando-se as ações que vinham sendo implementadas nos diversos países, percebe-se a ausência de uma política integrada e um certo distanciamento das causas desta ampliação que tem trazido a cada dia mais jovens e idosos para as ruas. Há também um descompasso entre as carreiras profissionais existentes e a realidade de sociedades que estão envelhecendo, vive-se até quase cem anos, mas aos 45 se é velho para continuar trabalhando.
Consenso de Nice

No ano 2000, na cidade de Nice (França) houve uma reunião do Conselho Europeuonde, a partir das discussões implementadas foi definida uma proposta de Planos Nacionais de Inclusão – PNAIs a serem implementados pelos países membros com o seguinte objetivo:

“criar políticas destinadas a evitar rupturas de existências susceptíveis de conduzir a situações de exclusão social”.

Naquela década, ocorreram diversos eventos e foram realizados estudos voltados para a Proteção e Inclusão Social dos sem teto. Em 2010 foi definida a estratégia integrada de luta contra o fenômeno dos “sem teto” a partir de enquadramentos políticos de base nacional.

Programas Europeus de combate á pobreza


A estratégia europeia de combate à pobreza e exclusão social, com objetivos a serem cumpridos até 2020, identifica o “sem teto” como objeto de prevenção e integração no contexto das políticas de inclusão social e lança uma Resolução com uma estratégia voltada para os sem teto (2011), destacando este segmento no seu pacote de investimento social para a coesão e o crescimento da Europa.

Os elementos centrais desta proposta incluem:


Mobilizar os estados membros e as políticas europeias para o combate ao fenômeno dos sem-teto;
Melhorar os mecanismos de governança, de parcerias e de financiamento ao combate a este fenômeno,incluindo-se aportes do Fundo Social Europeu;
Construir sistemas de levantamento de dados adequados a serem utilizados na definição de objetivos mensuráveis.

Dentre três desafios apontados no âmbito da proteção e da inclusão social, salienta-se a exclusão habitacional o que coincide com a visão do Parlamento Europeu que vem reivindicando a adoção de medidas urgentes na abordagem deste fenômeno. A partir deste diálogo, em 2008, os estados membro da UE  fizeram uma Declaração se comprometendo a criar condições para solucionar a situação destas pessoas até 2015.

Ao construir estes Programas contra a Pobreza, a Comissão Europeia reconhece que o fenômeno dos “sem abrigo” é uma questão complexa que é resultado não apenas de ausência de habitação, mas de toda uma espiral de pobreza que inclui este e outros elementos.

Relatórios da Comissão Europeia, elaborados entre 2001 e 2010, analisam os PNAIs e identificam uma priorização dos “sem teto” nas políticas de inclusão adotadas em quase todos os países,  ainda que em décadas, a resposta assistencial aos “sem teto” tivesse sido a oferta de abrigamento que visava a redução de riscos.

As novas propostas não descartam o abrigamento, mas apontam a necessidade de criação de estruturas mais amplas:


“… já não é suficiente providenciar uma solução meramente assistencial e de redução de riscos, em que abrigos disponibilizem cama e comida, mas sim uma preocupação de criar estruturas que possam conferir ao ser humano que se encontra nesta condição o exercício pleno da cidadania de acordo com suas reais capacidades, as quais devem ser alvo de potenciação. […] aquilo que era solução (abrigo e proteção básica) deixa de ser um fim e passa a ser um instrumento”. (RICARDO JR, 2013:101)
A primeira grande dificuldade identificada é a multiplicidade de conceitos na medida em que não há uma definição funcional comum. Esta variação ocorre não apenas entre países, mas em alguns casos, dentro de um mesmo país.

Como estes múltiplos olhares são a raiz de legislações diferenciadas, foi proposto um esforço no sentido de criar uma tipologia.

Tipologia Ethos (É usada para descrever o conjunto de hábitos ou crenças que definem uma comunidade ou nação.)

A tipologia ETHOS parte da relação destas pessoas com a habitação e considera:


Sem teto


   aquele que pernoita nas ruas e praças das cidades e que deve ser abordado por equipes volantes de “busca ativa”);

    aquele que está alojado em abrigos de emergência ou que se vê forçado a passar várias horas por dia em espaço público (abrigo noturno, alojamento precário, centro de acolhimento temporário).

Sem casa


    aquele que pernoite em abrigos e albergues por um tempo definido (vaga fixa);

    aquele que se encontra em alojamento temporário subsidiado pela política social, mas sem compromisso de transferência com moradia definitiva;

    casas abrigo para segmentos específicos (mulheres vítimas de violência doméstica; usuários de álcool e drogas em processo de reabilitação; centros para migrantes;

    alojamento destinado a sem teto: habitação assistida coletiva ou individual, alojamentos para famílias.

Habitação insegura


    Vivendo temporariamente com familiares, não por opção mas por falta de condições;

    Ameaçados de despejo legal ou a partir de moradias sem contrato;

    Vivendo sob ameaça de companheiros (violência doméstica documentada em Boletins de Ocorrência policial);

Habitação inadequada


    Estruturas temporárias: barracos, casas abandonadas em estado precário, ocupações ilegais de terrenos ou prédios;

    Habitações sem condições: áreas de risco detectadas pela Defesa Civil;

    Sobreocupação extrema: moradias multifamiliares inadequadas.

Nesta análise, foram considerados quatro aspectos do “ter casa”: (1) o espaço físico; (2) a privacidade; (3) a possibilidade de relacionamento; (4) o estatuto legal.

Pelas experiências analisadas, foram identificadas políticas de três tipos:

    Assistencialistas, com foco no abrigar puro e simples:

        Moradia temporária (albergues e abrigos), sem perspectiva de autonomização;

        Integradas (habitação, saúde, trabalho, proteção e aconselhamento):

            Buscando conferir condições para o pleno exercício da cidadania em suas dimensões socioeconômicas, de saúde (física e mental), educação, desporto, qualificação e trabalho e habitação;
            Housing First que será detalhada a seguir.

Metodologia Housing First


“Modelo integrado que tem a habitação como prioridade, mais do que como resultado final de várias etapas, voltado para um público (sem teto) pluridimensional que requer uma abordagem complexa”.
Todo este diálogo possibilitou a construção de uma proposta conhecida como Housing First (a casa primeiro). A origem desta proposta inspirou-se em experiências americanas (década de 90) que focavam egressos de hospitais psiquiátricos.

As pessoas eram realojadas em casas ou apartamentos (a sua escolha) numa perspectiva de redução de danos. Estas moradias eram acompanhadas por equipes multidisciplinares (psiquiatras, educadores, trabalho com famílias, álcool e drogas, emprego e trabalho e habitação).

A Housing First propõe medidas em diversos domínios políticos: habitação, saúde física e mental, trabalho e emprego, formação profissional, justiça e direitos humanos e proteção social. Não se trata apenas de uma multiplicidade de ações mas de uma política intersetorial e integrada.

O primeiro passo proposto por esta metodologia são ações emergenciais de acolhimento que são potencializados a partir de um trabalho de busca ativa realizado por equipes volantes que contatam estas pessoas ofertando os serviços.

O foco central é a oferta de respostas habitacionais imediatas.  Os sem teto não precisam passar por serviços intermediários (seja os voltados para usuários de álcool e drogas ou para desempregados de longo tempo).

A atuação do serviço social é feita a partir de um atendimento personalizado voltado para o resgate da autoestima que não se esgota no atendimento individual mas propõe atividades artísticas, culturais e desportivas onde é incentivado o trabalho em equipe e depuradas as dificuldades nas relações sociais.
O acesso a serviços (que são ofertados aos outros munícipes) é facilitado por um trabalho em rede envolvendo diversas políticas setoriais implementadas por órgãos governamentais ou não governamentais (conveniadas). Além da assistência social, fazem parte destas redes profissionais das políticas de saúde física e mental, educação e trabalho.

Este trabalho em rede não apenas deve garantir o diálogo e a articulação entre as políticas setoriais, mas sensibilizar autoridades públicas, dirigentes de ONGs e gestores de espaços públicos vinculados às diversas políticas setoriais buscando a sinergia e a identificação dos tratamentos diferenciados que potencializarão este acesso aos serviços regulares ofertados no local.

A metodologia aponta a necessidade de mensuração das ações indicando a prevenção ao consumo de drogas e a proteção á infância como impactos a serem alcançados.

Esta metodologia salienta que estes “sem teto” devem ter um envolvimento direto na definição das políticas. Aparentemente, esta é uma dificuldade na maioria dos países em virtude da participação social não ser eixo de governo.

Uma atenção especial deve ser dada aos trabalhadores que atuam com estes “sem teto” no sentido de que adotem uma postura que favoreça a integração social e a aceitação deles pela sociedade local.
Com esta preocupação, a metodologia enfatiza não apenas o perfil dos profissionais no que diz respeito às necessidades básicas mas as competências que favoreçam a mediação entre serviços e  a motivação que alicerce os processos de saída das ruas.

A identificação do potencial de participação destes “sem teto” para por mecanismos de empoderamento e reconhecimento de direitos dentre os quais são citadas as garantias de abertura de conta em banco, a posse/propriedade de moradias e o acesso a serviços.

O processo de transição para o housing first


O Housing First não foi desenhado para substituir nenhuns serviços aos “sem teto”… Ele deve ser incorporado como um conjunto diversificado de serviços dirigido a estas populações e visam potencializar a resposta aos serviços já existentes.

Nesta proposta não está incluída a extinção dos Abrigos existentes. Este serviço é ferramenta necessária até que as pessoas migrem para a nova proposta.  Sabe-se que há “sem teto”  em situações entendidas como crônicas que vão demandar permanentemente habitações partilhadas e monitoradas por técnicos de apoio.

Por fim, uma constatação apontada no documento aponta a necessidade de mediação com políticas de habitação social.  Em alguns países, os  gestores tem negociado com proprietários de casas abandonadas ou degradadas propondo parcerias no sentido de garantir a reforma ou mesmo de renúncia fiscal num processo de arrendamento para que sejam utilizadas por estes “sem teto”.


 Elementos chave da Housing First


Equipes multidisciplinares (psiquiatra, educador, família, álcool e drogas, emprego e habitação). Busca de aproximação com a comunidade e cada caso ser  tratado personalizadamente.
Além disso, estes agentes (trabalhadores) devem atuar como agentes estratégicos, trabalhando em rede e reforçando parcerias.

Escolha pelo usuário. A definição por casa ou apartamento e pela sua localização deve ser do próprio usuário.

Apoio individualizado visando o acesso a serviços públicos ofertados no município.

Redução de danos.  de saúde mental focada no processo e não na abstinência forçada.

Integração social e comunitária que implica num trabalho nas comunidades tanto para aceitação dos serviços como para melhorar a convivência com os “sem teto”

Limites e dificuldades


Perigo de manipulação em virtude da busca da diminuição da visibilidade e da higienização, levando a criminalização deste usuário. Nestes casos, é necessário um trabalho com os gestores e campanhas com toda a sociedade.

    A escolha se subordinar à existência de locais determinados em virtude da carência de recursos da política.  A saída é diversificar o leque de moradias a serem ofertadas, priorizando-se os locais de maior escolha dos “sem teto” que possivelmente apontam facilidades de acesso a serviços e a  trabalho.

    No trato com a sociedade, um aspecto que dificulta a aceitação é a resistência na partilha de recursos. Muitos munícipes apontam que estes “sem teto” são maus pobres (por sua indolência) e que o governo deveria priorizar os bons pobres (que trabalham). A divulgação dos casos de sucesso podem ser elementos para Campanhas de Sensibilização e Conscientização que visem a aceitação do diferente.

Considerações Finais


Ao buscar conhecer as novas experiências que vem sendo discutidas em termos mundiais, senti o tempo todo a necessidade de cotejar este processo com a construção da Política Nacional para População de Rua construída no Brasil.

Partindo do livro da STOFFELS, cuja Tese foi defendida na década de 70, e passando pelo processo desencadeado pela Prefeitura de São Paulo a partir de 1989, pode-se perceber que muito do que está sendo proposto, hoje, tem semelhanças com as análises e experimentações brasileiras.

Projeto Oficina Boracea


Baseado na pedagogia do direito e da emancipação, este Projeto foi construído metodologicamente a partir da reflexão das questões do cotidiano e do incentivo à participação da população no desenvolvimento de um protagonismo social. Sua principal finalidade é desencadear a reconstrução da autonomia das pessoas, estimulando sua independência e visando ações emancipatórias, o Projeto garantia a instalação de serviços que garantam acolhida, convívio e autonomia às diversas situações das pessoas em situação de rua, inclusive acompanhadas por famílias, carroças e cachorros.

Tratava-se de uma proposta Inter setorial – integrando várias Secretarias Municipais e um número significativo de ONGs que, a partir de conveniamentos, executam serviços.

A proposta gerencial propõe um diálogo entre a gestão vertical – tradicional no trato da coisa pública – e uma gestão horizontal: trabalhar de forma cooperativa, cruzando as fronteiras organizacionais, construindo uma Rede Local.

A rede assim construída garante o diálogo entre Instâncias Municipais e parceiros externos à Prefeitura estão assentados nos seguintes princípios:

    Ø Reconhecimento dos Direitos desta População-Sancionada em 27 de maio de 1997, a lei 12.316 reconhece publicamente o “morador de rua” que vem pouco a pouco consolidando sua identidade, adquirindo consciência de que também é brasileiro e deve lutar contra as discriminações para ser aceito como cidadão.

    Ø Participação Cidadã – O Projeto provê um conjunto de seguranças sociais, através de múltiplas ações que vão desde o trabalho social no processo de abordagem de rua que constrói vínculos e pactua alternativas até os processos de inserção. Estas ações são desenvolvidas por várias Secretarias Municipais, por parcerias com ONGs, Universidades e Empresários comprometidos com a construção de caminhos que possibilitem que estes conviventes deixem a situação de “pessoas em situação de rua”.

    Ø Reconhecimento das potencialidades– Os estudos que vem sendo feitos demonstram que o perfil das pessoas em situação de rua de São Paulo mudou muito nos últimos anos.  São ex-trabalhadores de diversos ramos profissionais, pessoas com diferentes níveis de escolaridade que vai do analfabetismo a pessoas com formação universitária, pessoas que pertenceram à classe média e aquelas que sempre tiveram dificuldades de sobrevivência, egressos do sistema penal e pessoas que nunca cruzaram o portal de uma delegacia. Evidentemente, a vivência que trazem é variada e para que se leve em consideração este potencial, precisa-se de um processo de resgate da autoestima e um levantamento do seu significado, de forma a partir deste segundo patamar.

A busca da sinergia para potencializar as diversas ações em curso, exige um esforço de reorganização interna de forma a garantir a integração dos serviços. Para tanto, foram criadas várias instâncias de coordenação:

Secretaria Municipal de Assistência Social: Tendo a responsabilidade institucional da condução do Projeto, a SAS é a maior instância de decisão do Projeto.  Cabe à SAS a definição da Diretriz, a articulação e a manutenção da matricialidade assim como o esforço na captação de recursos que torne possível a viabilização e continuidade da proposta construída em diálogo com as outras instâncias.
Conselho Gestor : Reunindo gestores público municipais e das ONGs envolvidas,  o Conselho  acompanha a sistematização permanente e é quem deve desencadear os processos de avaliação periódica para subsidiar a manutenção ou alteração do rumo das ações.

Coletivo Técnico: Formado pelos coordenadores dos projetos definidos pelas ONGs conveniadas, é responsável pela consolidação de uma gestão horizontal a partir da qual não apenas são compartilhadas as decisões sobre as estratégias comuns aos diversos projetos, mas construídas ações conjuntas.

Coordenação do Projeto Oficina Boracea: Responsável pela execução do Projeto, a coordenação responde por várias tarefas, a saber:

Sensibilizar para a ação matricial, capacitando as equipes no que se refere a esta forma de gestão;
Proativa na discussão da lógica e do funcionamento dos projetos e de sua participação no conjunto das ações, orientando os projetos para a superação de suas dificuldades;

Capitanear a definição de indicadores, monitorando em conjunto com as áreas, e propondo novos projetos quando necessários;

Apoiar a captação de recursos (Relações Internacionais, SAS Central, Amigos@Boracea);
    

Coordenar a produção de materiais de reflexão.


Equipe Local: Formada pelas equipes de serviço, é responsável pelo cotidiano do Projeto, além das tarefas específicas de cada projeto, a Equipe Local deve consolidar-se como uma grande equipe multiprofissional que atua intersetorialmente de forma a garantir a  simultaneidade e a interação entre as ações dos Projetos.

Autonomia em Foco


Respondendo ao desafio de buscar alternativas de acolhimento que respeitem a singularidade do indivíduo ou grupo familiar, sua vulnerabilidade no contexto social, seus recursos simbólicos e efetivos, bem como sua disponibilidade para se transformar e dar conta de suas atribuições, o Projeto Especial autonomia em foco visa restaurar e preservar a integridade, a autonomia e o protagonismo das famílias/indivíduos com vistas ao desligamento da rede de acolhimento socioassistencial.

Este processo de reinserção social passa pelo fortalecimento de parcerias realizadas com os recursos e serviços socioassistenciais da cidade de São Paulo, de forma que a população atendida conquiste sua cidadania. O Projeto propõe a cogestão do espaço de convivência, de forma que as tarefas e rotinas diárias são de responsabilidade de cada núcleo familiar/individuo, na perspectiva de que a protagonismo faz parte do processo socioeducativo e favorece a autonomia.

O que se espera é que ele dê uma oportunidade ao convivente para que ele retome hábitos de gerenciar tempo, espaço e relações interpessoais.

Metodologia de Trabalho


Entendendo que o processo de reinserção social das pessoas em situação de rua passa pelo fortalecimento das parcerias realizadas com os recursos e serviços socioassistenciais, de forma que a população atendida conquiste sua cidadania, o Projeto propõe  a cogestão do espaço de convivência, de forma que as tarefas e rotinas diárias são de responsabilidade de cada núcleo familiar/individuo, na perspectiva de que a protagonismo faz parte do processo socioeducativo e favorece a autonomia. A cogestão não se configura na desresponsabilidade  da Organização na gestão efetiva do espaço, mas sim uma oportunidade do convivente retomar hábitos de gerenciar tempo, espaço e  relações interpessoais.

A família/individuo deve conhecer o espaço e a proposta do Projeto e aceitar a corresponsabilidade no que se refere a confecção do seu alimento e a limpeza e organização do seu dormitório, bem como da área comum. O projeto tem como princípio preparar e encaminhar o indivíduo a uma vida digna e autônoma.


Participação na gestão


Assembleias mensais de avaliação com o corpo de funcionários e conviventes buscando novos caminhos para a gestão do cotidiano, bem como propor novas estratégias para enfrentar os desafios..

Tempo de Permanência: Inicialmente será pactuado com o individuo/família o tempo necessário para esta nova etapa da vida e posteriormente avaliado entre equipe/individuo/família as possibilidades de estender o tempo.


De Braços Abertos


Na mesma linha  que as propostas “housing first”, a Prefeitura de São Paulo criou uma proposta nomeada “de braços abertos” que se propõe a ser a porta de entrada para o processo de saída das ruas.
O cenário no qual se baseou foi a Cracolândia – situada na área central da cidade que era considerada a maior concentração de usuários de Crack do Brasil.

“A pesquisa nacional sobre uso de crack no Brasil publicada em 2014 pela Fiocruz constatou que 80% dos 30 mil usuários pesquisados em 26 capitais são negros ou pardos, 80% são homens, 80% não chegaram ao ensino médio, 50 % estiveram presos. Em média, têm 28 anos e usam a droga há 10. Entre as mulheres, 50% têm filhos ou se prostituem” (LANCETTI.

O programa oferta moradia nos hotéis da região, alimentação e trabalho. Estas pessoas, homens e mulheres, são admitidas em trabalhos de varrição das ruas da cidade, sem exigências de experiência profissional ou de abstinência das drogas das quais muitos faziam uso.

Foram os próprios usuários que cunharam este nome – De braços abertos.  Em dezembro de 2014 já haviam sido atendidas mais de 500 pessoas, 10% das quais voltou para junto de seus familiares. 5% estavam trabalhando com carteira assinada e outro tanto havia passado por cursos de  capacitação.

Esta proposta parte “do respeito e do acolhimento às subjetividades dos usuários e adotar as medidas adequadas a cada caso, sem ilusão com as “soluções” de resultado imediato e que, normalmente, se baseiam em repressão e isolamento”  


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